A reportagem da Folha tomou conhecimento
do caso pelo Folhaleaks, canal criado pelo jornal para receber
informações e documentos.
“Em 30 anos de vida acadêmica, eu nunca
tinha visto isso”, reconhece o pró-reitor de pesquisa e pós-graduação da
UFPR, Sergio Scheer.
Em geral, uma vez que um trabalho de
mestrado ou doutorado é aprovado por uma banca de examinadores, o aluno
tem, no máximo, algumas semanas para fazer correções finais antes de o
trabalho ser “eternizado” na biblioteca da universidade.
Para a UFPR, que concluiu investigação
sobre o caso no mês passado, houve apenas uso indevido de imagens. As
imagens infravermelhas teriam sido publicadas sem autorização da empresa
curitibana Thermotronics.
O dono da empresa, no entanto, afirma
que as imagens são fraudulentas, já que servem de base para descrever
experimentos que não teriam ocorrido da maneira como afirmam os
cientistas.
Ratos na berlinda
O
mestrado do médico Angelo Manoel Grande Carstens envolveu a
visualização, via infravermelho, do efeito de dois anestésicos, a
bupivacaína e a levobupivacaína, nos vasos sanguíneos de ratos. No ano
passado, os resultados dessa mesma pesquisa saíram também na “Revista
Brasileira de Anestesiologia”.
“É possível conseguir informações
fantásticas sobre o metabolismo usando essas imagens de infravermelho”,
diz o engenheiro Mário Cimbalista Junior, dono da Thermotronics que
denunciou a suposta fraude à UFPR.
Segundo Cimbalista Junior, ele tinha
sido sócio de um dos orientadores de Carstens, o médico Marcos Leal
Brioschi. Ele afirma que costumava ceder as dependências da empresa para
experimentos. ”Resolvi procurar na internet referências à Thermotronics
em artigos científicos e me deparei com o estudo. Fiquei chocado”,
conta.
Enquanto o trabalho declara que os
experimentos ocorreram num laboratório da UFPR em 2007, Cimbalista
Junior diz que foram feitos em 2004, na cozinha de sua empresa.
Os pesquisadores também teriam errado no
número de ratos filmados no estudo, no número de roedores mortos no
experimento e nas informações sobre os aparelhos utilizados. “Tudo isso
compromete os resultados”, disse.
Investigão
A
universidade criou uma comissão para investigar o caso, a qual concluiu
que as imagens, nas quais o empresário baseou sua denúncia, foram
usadas de forma meramente ilustrativa. ”Faltou dizer isso na dissertação
original. A gente sempre diz aos alunos que é preciso deixar clara a
fonte de tudo o que se usa num trabalho”, afirma o pró-reitor.
Segundo ele, o estudo usou como base
outro aparelho, que não fazia o mesmo tipo de imagem. Os resultados,
portanto, ainda valeriam.
O editor-chefe da “Revista Brasileira de
Anestesiologia”, Mário Conceição, afirmou à Folha que a equipe da
publicação ficou “preocupada” com as denúncias. No entanto, diz ele, “os
conceitos e resultados apresentados foram de responsabilidade dos
autores”.
A Folha apurou que Cimbalista Junior está processando Brioschi. Nenhum dos dois quis comentar a ação judicial.
Outro lado
Por meio de sua advogada, Eloisa Pontes
Tavares, o médico Marcos Leal Brioschi, um dos orientadores da
dissertação de mestrado e do artigo colocados sob suspeita, disse que
preferia não se pronunciar sobre o conteúdo da denúncia, declarando que
“a posição oficial da UFPR reflete a realidade dos fatos”.
Para a universidade, o problema dos trabalhos foi apenas no uso não autorizado de imagens infravermelhas.
A reportagem da Folha procurou por
telefone e por e-mail o anestesiologista Angelo Manoel Grande Carstens,
autor do mestrado, e deixou recado no hospital onde ele trabalha e em
sua casa, mas o médico não respondeu as mensagens.
Fonte: Folha
0 comentários:
Postar um comentário